Autores: Brenda Breda Passon e Camila Martins Lopes - Acadêmicos de Medicina pela FM-UFMG
Como já é de
conhecimento dos portadores, as hepatites virais podem ser diferenciadas pelo
tipo de vírus envolvido na infecção. Assim, há tipos distintos de progressão da
doença, com diferentes riscos agregados. Contudo, também é importante ressaltar
que um mesmo patógeno pode causar manifestações diversas dependendo da pessoa
infectada. Fatores como o próprio sistema imune do portador podem estar
envolvidos nessa diferenciação.
Aos portadores de
hepatites, também é clara a relação do fígado com a doença (o nome dela vem
disso!), mas muitos podem ignorar o fato de que as hepatites virais podem ser
assintomáticas ou envolver manifestações que não sejam hepáticas. Nesse
sentido, este texto tem o objetivo de informar e auxiliar aqueles que se
encontrem perdidos quanto aos seus novos sintomas, muitas vezes não tão óbvios,
que podem se relacionar à doença.
Seguindo a ordem
alfabética, começamos pela hepatite A. Essa doença não cronifica, ou seja,
tende a ser resolvida em um período de tempo relativamente curto, mas pode ser
acompanhada por dores nas articulações, rashs
(irritações de pele) transitórios, que vem e passam, e, em alguns casos raros,
inflamação de vasos sanguíneos e artrite (inflamação das articulações). Outras
situações que podem ser vistas são alterações no eletrocardiograma (o ECG,
exame realizado pelo cardiologista para verificar o estado do coração); anemia
aplásica (na qual não se formam hemácias, nossos glóbulos vermelhos, do modo
como deveria); polirradiculoneurite, caracterizada por dor, fraqueza muscular,
reflexos diminuídos e cujas consequências podem assustar tanto quanto o nome; e
até mesmo outro tipo de hepatite, autoimune, no qual o próprio sistema imune do
portador ataca o fígado.
A hepatite B, por sua
vez, tem uma taxa de cronificação maior, variável com a idade. Suas
manifestações extra-hepáticas podem se dar, portanto, na fase aguda (inicial) ou
na fase crônica. A fase aguda pode ser acompanhada, como na hepatite A, por
inflamação e dor nas articulações, e por rash
cutâneo, que pode ser caracterizado por urticária. As articulações são
acometidas devido à deposição de estruturas conhecidas como imunocomplexos.
Geralmente, cerca de 20% das pessoas afetadas apresentam essa condição. Comumente,
os dois lados do corpo são afetados e muitas articulações (mãos, punhos,
joelhos e tornozelos) podem ser acometidas ao mesmo tempo. Rigidez matinal,
causada exatamente por esses problemas, pode ocorrer. A infecção crônica, por
sua vez, pode ser acompanhada de glomerulonefrite e poliarterite nodosa (PAN).
Sobre essas duas últimas manifestações, é interessante fazer alguns
comentários.
Quando aqueles mesmos
imunocomplexos se depositam nos néfrons, unidades funcionais que compõem os
rins e são responsáveis pela sua função, podem ocorrer as glomerulonefrites, a
inflamação dessas estruturas. Há vários tipos, podendo haver presença de
proteínas na urina, assim como sangue. É mais comum em crianças e é possível o
tratamento com interferon (IFN).
Já a poliarterite
nodosa é uma inflamação sistêmica dos vasos, que pode levar a necrose, isto é,
uma inflamação que pode ocorrer nos vasos de todo o corpo levando a morte de
células que os compõem. Contudo, observa-se um acometimento mais acentuado de
vasos de médio calibre e em segmentos isolados dos vasos. Quando a situação
chega ao nível de morte celular intensa, outras consequências mais graves podem
ocorrer caso não haja intervenção, como aneurismas, trombose, infarto e
hemorragia.
O caso da hepatite C
já tende a ser mais associado a manifestações extra-hepáticas, uma vez que
estas estão relacionadas mais comumente a infecções crônicas e a hepatite C tem
por característica uma alta tendência a cronificar. As manifestações geralmente
têm relação com os tais imunocomplexos já falados ao longo do texto. As
principais a serem destacadas na hepatite C são a crioglobulinemia, que se
encontra associada ao vírus C em 13 a 43% dos casos; glomerulonefrites, que já
foram explicadas quando falamos da hepatite B; síndrome de Sjogren;
tireoidopatias, condições que afetem a tireoide, glândula localizada na região
do pescoço que produz hormônios importantes para a manutenção do metabolismo;
diabetes Mellitus; doenças linfoploliferativas; vitiligo, aquela condição que o
Michael Jackson tinha; porfiria cutânea tardia e poliarterite nodosa, que
também já foi bem comentada para a hepatite B. Para que as explicações fiquem
claras, serão discutidas algumas manifestações sobre as quais ainda não foram
feitos comentários.
A crioglobulinemia
envolve a deposição dos imunocomplexos em vasos sanguíneos de pequeno e médio
calibre, especialmente em temperaturas menores. A condição pode permanecer sem
sintomas em muitos casos, mas em outros manifesta-se como uma leve inflamação
dos vasos com hematomas característicos e dor nas articulações. Em casos mais
graves, os vasos sanguíneos podem estar severamente danificados, comprometendo os
rins e o sistema nervoso central. Tratamento com interferon pode amenizar os
sintomas, mas pode ser necessário o uso de corticosteroide.
A síndrome de Sjogren
tem caráter autoimune, com comprometimento sistêmico, e se caracteriza por um
ressecamento de mucosas oral, ocular e do ducto lacrimal associado a quadros
reumatológicos, acometendo os diferentes tipos de tecido conjuntivo, desde
ósseo a adiposo. O papel patogênico do vírus C, no entanto, permanece
desconhecido.
Sobre as
tireoidopatias, é importante destacar que há muitas controvérsias e que o
próprio tratamento com interferon pode causar alterações de função tireoidiana,
gerando uma necessidade de avaliação dessa função em pacientes candidatos ao
uso de IFN. Das doenças linfoproliferativas, destacam-se os linfomas
não-Hodgkin, que podem ter uma relação com a ativação continuada de parte dos
glóbulos brancos em pacientes com predisposição genética.
Muitas das doenças
ainda não têm os mecanismos conhecidos, embora pareçam ser reações de
autoimunidade. Dessa forma, são necessários muitos estudos para elucidar
corretamente os mecanismos envolvidos nas ações desses vírus que, embora tão
associados a lesões hepáticas, podem causar tantas outras manifestações.
Vale lembrar que, se
bem diagnosticadas, essas muitas dessas manifestações podem ser tratadas ou
pelo o menos atenuadas pela equipe de saúde. Daí a importância de ficar atento
aos sinais e tentar relatá-los corretamente aos médicos e outros profissionais
da área.
Este texto possuiu
função de ajudar a sanar algumas dúvidas que muitos pacientes têm em relação ao
que ocorre nos seus próprios corpos durante a infecção. Esperamos que tenha
sido atingido o objetivo e, caso contrário, perguntas são bem vindas nos
comentários.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Dra.
Eloiza Quintela. Disponível em:
<http://www.eloizaquintela.com.br/boasdicas_09.html>. Acesso em 02 de
junho de 2014.
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Sociedade
Brasileira de Reumatologia. Disponível em: <http://www.reumatologia.com.br>.
Acesso em 02 de junho de 2014.
×
Centro
de Vigilância Epidemiológica. Disponível em:
<http://www.cve.saude.sp.gov.br/htm/hepatite/pdf/aula_mlgferraz.pdf>. Acesso
em 02 de junho de 2014.